terça-feira, 17 de abril de 2012

No Balanço da Capoeira - Marcos Ramos


 Minha sentença é verdadeira,
E por ela bato meu pé no chão
E na capoeira brasileira,
Eu luto pela nação...

Então chamo meu orixá para luta,
Combatente e destemido guerreiro
Que tem uma valorosa conduta,
De um caboclo brasileiro...

Odôya! Camará,
Paraná ê, Paraná ê Paraná...

Nossa nação se veste de branco
Lutando pela paz de viver
E vem chegando pelo flanco
Tão rápido que não pode ver...




Dando cambalhotas como o vento,
Um absinto negro da escuridão
A capoeira é o próprio advento,
De quem luta com a razão...

 Êpa hey oya! Camará,
Paraná ê,
Paraná ê Paraná...

Ouça o que eu vou dizer agora,
Mas preste muita atenção,
Vou variar na regional, e na angola,
Fazendo soar o berimbau na mão...




                                                      Pois sobrevivi ao navio negreiro,
Como a semente que germinou
Queimando sobre a brasa do fogareiro,
E como cinzas pelo mundo se esparramou

Patacori Ogum! Camará
Paraná ê,
Paraná ê Paraná...




Quando vim da África, eu já sabia,
Que era abençoado o chão que beijei
É a terra da minha alforria,
Com capoeira por ela lutei...

O berimbau está me chamando,
Para dar Rabo de arraia na escuridão
Bênção meu pai, eu sigo rodando,
Pois no tempo eu vou dar um Esporão...

Êpa Babá! Camará,
 Paraná ê,
Paraná ê Paraná...

O vento está levando as folhas secas,
Mas as folhas verdes, não leva não
Mantenha a fé na sua cabeça,
Mantendo o Martelo de chão...

Oxalá, minha cabaça, arame, pedaço de pau,
Com o som do Amazonas, Iuna e São Bento
Com atabaque, pandeiro e berimbau
Maculelê, vai sacudir seu abadá ao vento...

Caô Cabecilê! Camará,Paraná ,Paraná ê Paraná...

(Marcos Ramos)

"O surgimento da Capoeira no Brasil foi devido as condições em que
os escravos eram obrigados a viver , condições que muitas vezes
os levavam a morte.A cultura africana sofre modificações face à nova
realidade e toda a revolta de um povo vai se moldando a ansia de
liberdade , surge então a capoeira uma luta em forma de dança que
tornou realidade um sonho chamado de liberdade."

Fotos: praia São José da Coroa Grande - PE

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Acordar - Álvaro de Campos

Eu adoro todas as coisas
E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.
Tenho pela vida um interesse ávido
Que busca compreendê-la sentindo-a muito.
Amo tudo, animo tudo, empresto humanidade a tudo,
Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas.
Para aumentar com isso a minha personalidade.
Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio
E a minha ambição era trazer o universo ao colo
Como uma criança a quem a ama beija.

Eu amo todas as coisas, umas mais do que as outras —
Não nenhuma mais do que outra, mas sempre mais as que estou vendo
Do que as que vi ou verei.
Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações (…)
Penso nisto, enterneço-me mas não sossego nunca.

Dá-me lírios, lírios
E rosas também...


Álvaro de Campos
Um dos mais conhecidos heterónimos de Fernando Pessoa